domingo, 1 de abril de 2012

Verdade inconveniente



“Para psicanálise a toxicomania não é só doença. É sintoma”, Maria Rita Kehl.

por Roney Moraes *

Não é fácil falar sobre drogas. Uma vez que ninguém se interessa pelo assunto. Preferem jogar o problema para debaixo do tapete, a não ser àqueles que sofrem de alguma maneira com o problema em sua família ou outra circunstância parecida.  A verdade inconveniente é que as drogas estão dentro da casa de todo o mundo, sem exceção.
Para aqueles que esbugalharam os olhos. Poderia escrever uma indireta. Mil iriam ler, mas você, que precisa realmente entender a questão, não ia dar a mínima. Por isso venho falar um pouco sobre esse “mal” que tanto assombra o seio de muitas famílias.
Ação conjunta! Esta é a frase de ordem para que as coisas realmente aconteçam no que diz respeito ao combate às drogas, sem esquecer a intervenção e, principalmente, tratamento dos dependentes químicos, onde muitos trabalhos devem ser revistos e reavaliados. 
Os esforços do poder público são louváveis até que esbarrem na palavra política, tão controversa que hoje perdeu seu verdadeiro significado tornando qualquer objeto de sofrimento social um trampolim para uma pauta eleitoreira partidária. E não é isso que queremos nesse momento.
O que a opinião pública e a sociedade realmente querem é uma solução paliativa para o “mal” do milênio, ou seja, o consumo doentio e abusivo de substâncias psicoativas que destroem não só a família, mas a “pólis”, como sendo reunião dos cidadãos, sob mesmas leis e território, formando a cidade-estado. A comunidade. É dessa palavra (pólis) que deriva o termo política. 
Devemos recorrer a estratégias de enfrentamento levando em consideração a região, cultura e perfil, se urbano ou rural, para uma melhor eficácia nessa luta que é árdua, infinita, cansativa, mas que vale a pena quando uma vida é restaurada por ações sérias e precisas que vão direto a causa do “problema”, não apenas à superficialidade do uso em si. 
Todas as ações coletivas que não levarem em consideração a individualização e a subjetividade do sujeito serão fadadas ao fracasso. Quero dizer com isso que padrões imutáveis de tratamento ou muros de concreto aprisionando dependentes não resolvem a questão e nunca resolverão. O tema é mais profundo do que imagina nossa vã filosofia, por isso recorro ao pensamento de Hannah Arendt quando ela falava sobre a causa de nossa ação.
O que nos faz agir politicamente? O interesse da filósofa alemã não é diferente do nosso, pelo menos do meu. Em suas reflexões, originárias do pensamento grego, ela distingue dimensões da atividade humana e, uma delas, em especial, me chama atenção, a “animal laborans”, que sugere um agente aprisionado pelas necessidades biológicas e trabalha somente para prover sua subsistência. Ora! O que fazem os dependentes a não ser mover-se para conseguir saciar a insaciável compulsão? 
Penso que, como afirma a obra “A Condição Humana”, a ação política deve manter instituições responsáveis pela criação de condições para receber os recém chegados ao mundo. Atualizando para o tema, ouso dizer que também merecem a classificação de renascimento, os que obtiveram êxito em um tratamento de dependência química, uma vez que retornam dos mortos. 
Por isso tenho que reconhecer que o poder público sozinho não pode resolver o problema. Toda a sociedade deve se envolver, pois a droga, em si, não é o foco, é mais um sintoma de um problema social que deve ser resolvido, para que o indivíduo não procure esse “escape” e enfrente a vida como ela realmente é. Mas, para isso, ele, o adicto, precisa de ajuda de pessoas que não abusem de substâncias psicoativas que estão ao alcance de qualquer um.
Enfim, os puritanos, críticos e “caretas” consumidores frenéticos de álcool, tabaco, tranquilizante, calmante e outras drogas lícitas deveriam tomar mais cuidado para não acabarem entre os 10% de pessoas que não possuem qualquer controle sobre essas substâncias. Pensem nisso!

* Roney Moraes é psicanalista, jornalista e teólogo.

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