*Roney Argeu Moraes
Resumo: Este artigo
tem a finalidade de provocar a discussão sobre a toxicomania e os métodos
atuais de tratamentos para dependentes químicos. A importância da teoria
psicanalítica na abordagem terapêutica, crítica à forma de como vem se
realizando as intervenções em usuários de substâncias psicoativas. Algumas
questões que nada contribuem com o tratamento do toxicômano, seu perfil e a
ineficácia, em alguns casos, de encaminhamentos para o atual sistema de
funcionamento dos Centros de Atendimentos Psicossociais Álcool e outras drogas
(Caps/ad).
Palavras-chave: psicanálise,
tratamento, caps ad, intervenção, dependência, comunidade.
1. Introdução
Com objetivo de
aprofundar a pesquisa bibliográfica e de campo para desmistificar alguns
conceitos sobre tratamento de dependentes químicos surgiu a intenção de se
elaborar um artigo que contribua para o pensamento de novos métodos de ação
para o tratamento de dependentes químicos e codependentes. O suporte teórico
compartilhado entre a psicanálise e demais métodos terapêuticos fundamenta-se
numa pesquisa bibliográfica e de campo em autores que tratam do assunto e
usuários de drogas lícitas e ilícitas são entrevistados.
2. A Toxicomania e a psicanálise
O que a
psicanálise pode fazer para combater esse “mal” contemporâneo? O profissional
logo transforma em patologia a obsessão e compulsão. Sintomas que levam o
indivíduo a usar substâncias psicoativas ou ter outros males como consumo
exagerado, anorexia, bulimia, obesidade mórbida e, fatalmente, a toxicomania.
Santiago (2001)
postula que a toxicomania, sob o ponto de vista psicanalítico, é efeito de um
discurso. No quadro delineado pela psiquiatria parece não existir sujeito em
questão, contudo algo que resulta de uma determinada e bastante específica
influência mútua entre o organismo e ambientes distintos. Diante de tal
configuração, torna-se viável a leitura da toxicomania segundo uma maneira
discursiva, catalogada à operação realizada pela ciência moderna relativo à
descoberta e ao concomitante rechaçamento do próprio indivíduo, o olhar que a
psicanálise lança para o fenômeno traz o convite para verificar a
plausibilidade da inclusão do mesmo no próprio campo psicanalítico (GIANESI,
2012).
Esse é um sintoma
do homem moderno, que por estar imerso no discurso capitalista, buscaria sua
forma particular de obter a satisfação. O individualismo, estresse e outras
complicações do cotidiano fazem com que o indivíduo busque adequação no modismo
ou um escapismo que o leva a fugir da realidade em que vive e as drogas são
ótimas nesse sentido.
Segundo Nogueira
(1999, p. 14) “o toxicômano é um desistente do jogo de linguagem, é um
desistente da simbolização. O toxicômano é aquele que encontrou um meio (a
droga) para o prazer que aniquila, com o passar do tempo, o próprio prazer.
Assim, dentro
desse discurso é oferecida uma “prótese imaginária”, mantendo-os identificados
a um significante – “eu sou alcoólatra, dependente de...”, frequentemente
observados em suas falas. Os sujeitos ficam identificados no lugar de objeto e
não ao lugar de objeto-causa, permanecendo atados ao seu “parceiro-sintoma”.
Ao discorrer com
Freud (1930) em um mais além, pode-se sugerir que os sujeitos, quando incluem
essas experiências em seus dizeres na análise, estão tentando lidar com sua já
instituída relação com o mal-estar, com o gozo fálico e, portanto, com a
castração.
A particularidade
de cada sujeito é descartada e os afetados tornam-se apenas portadores de uma
“doença incurável”, onde os tipos de drogas utilizadas são hipervalorizadas,
classificando-os pelo uso, abuso ou dependência. Nesse campo, de tratamento
convencional, a cura passa primeiramente pela exigência da abstinência e, em
seguida, pela introdução de medicamentos e orientações dentro do enfoque
comportamental e cognitivo.
Lacan (1998)
estabelece uma concisa relação entre a repetição, o saber e o gozo.
Acompanhando e ordenando as repetições está um saber, meio de gozo. Quanto a
esta menção ao saber, diz-se que assim se chama o conjunto dos significantes
que se repercutem e reedita, de modo não semelhante, o reprimido. Toda a vida
dos indivíduos, por meio dos sintomas, de outras constituições do inconsciente
e da estrutura do fantasma, está ordenada por esse saber que trabalha em cada
um.
A seu modo a
psicanálise demonstra que pelo inconsciente existe tendência à repetição. A
repetição relaciona-se à falta, e, portanto, ao objeto. Na repetição o sujeito
castrado busca o domínio da ausência. Porém, também é característico da
repetição o fracasso da tentativa de reencontrar o perdido. Assim, a
psicanálise diz que não há repetição total. A repetição não é uma reprodução
(GIANESI, 2012).
Os toxicômanos,
por sua vez, não se apresentam à clínica, divididos e desejosos de saber sobre
o seu “mal”, sedentos por uma interpretação. Desejam apenas amenizar a angústia
e, talvez, aprender a fazer algo com seu corpo devastado por essa forma de
prazer além de manejar a castração.
Assim, no campo da
toxicomania, caracterizada pela atuação dos sujeitos, exigiria, também, um ato
por parte dos psicanalistas que, ao assumirem a posição de analista,
ofereceriam um lugar para o particular (o Ser) de cada sujeito.
Leite (2000, p.56)
diz que “para a psicanálise, o sintoma só existe quando falado pelo paciente e,
portanto tem como paradigma o ato-falho”. Isto se dá pelo fato porque está
estruturado como uma linguagem, também em termos de significante e significado,
o sintoma caracteriza o signo. Não é aquilo que aparece no concreto e pode ser
observado de imediato. Como metáfora, altera a maneira da língua, modifica de
valor e sentido, assume diferentes formas; ressignifica-se ao longo do tempo,
embora sempre se relacione com a castração”.
Conforme Nogueira (p. 84, 1999):
A paixão pelo
gozo, primário e fundamental, des-situa o significante e o sujeito e faz com
que este ser embriagado e enamorado procure um tratamento apenas quando a
ilusão na qual acredita com enlevo a devoção prega-lhe algumas peças. E, quando
procura, procura com a esperança de que o significante e o sujeito continuem
quietos. A luta pelo bem-estar do toxicômano é, paradoxalmente, nada mais que a
luta para o mal-estar na civilização seja reconhecido e que o gozo do corpo
possa receber algum obstáculo. É, portanto, uma batalha contra o prazer sem mediação,
o prazer com o qual todos devaneiam.
O que é comum para
todos os toxicômanos é que no lugar do objeto de desejo (que é simbólico e faz
parte de uma eterna busca...) eles o substituem pelo objeto de necessidade.
Estes são imperativos. O objeto de necessidade é aquele no qual o dependente é
escravo.
De acordo com
Nunes (1999) a droga seria como uma tentativa de preencher a falta Simbólica do
sujeito. A instalação da falta Simbólica introduz, no sujeito, a possibilidade
inconsciente de almejar, o que rompe com uma idéia de completude. Consistindo
em qual for o objeto, ele não restaura essa falta. Para o sujeito toxicômano, a
falta inaugural não é passível de metaforização ao ser inscrita no Simbólico.
Ela atende à cobrança de um recobrimento Real, de um objeto, como a droga, para
na fantasia de preencher a falta, restaurar uma completude imaginária,
evidenciando sua própria vivência.
Costa (2004)
complementa destacando que o toxicômano procura repor a incompletude com
objetos idealizados; tenta defender-se da ansiedade com um objeto postiço. As
drogas instituem uma promessa irrecusável de tapar esse buraco, impreenchível.
É a falta significante, pela castração, que permite o sujeito dessa necessidade
postiça de completude.
No toxicômano, tal
procura de completude nos objetos (como as drogas) se reproduzirá
infinitamente, na ansiedade do indivíduo para localizar o objeto que a causa.
Essa busca totalizada escusa o falante de confrontar-se com o desejo, isto é, o
que ele não almeja é, justamente, pagar o preço da castração (COSTA, 2004).
As colocações de
Conte (2001) vão ao encontro destas ideias. Quando o bebê distingue-se da mãe
pela intervenção da função paterna, esta separação provoca-lhe uma falta, que
funcionará como castração simbólica. É a falta que consente que apareça o
desejo. A droga desempenha, então, uma função na vida psíquica, como diz Conte
(2001), de anteparo à castração. Ela é utilizada, para que o indivíduo não se
encontre com a falta.
A impulsividade de
ter alguma coisa produz um vazio e este a adesão aos baratos. Tudo fica chato.
Então a pergunta é: “o que é que me falta que eu preciso estar grudado o tempo
todo nesse objeto que me complete?”
O toxicômano, com a ajuda da psicanálise, teria que
chegar a entender que o que lhe falta não é a droga, mas algo que carece a todo
o ser humano. Desde o nascimento somos faltantes de alguma coisa. E essa
necessidade de busca, mesmo inconsciente, é que nos faz pensarmos,
conversarmos, criarmos e aprendermos a lidar com a dor de viver.
Freud (1930) traz
a definição do uso de drogas como sendo uma tentativa de suspensão da
existência frente à dor de viver. A cada desequilíbrio, as substâncias tóxicas
atuariam como um quitapenas, posto que, como um amparo contra a aflição. A
intoxicação seria um modo de aguentar o mal estar necessário imposto ao ser
humano que existe em uma determinada civilização.
Torossian (2004)
coloca que o psicanalista não trata a dependência química, contudo trata de um
sujeito que sofre de toxicomania. As correntes que aderente a incurabilidade
assinalam para a cronicidade do sintoma. Na maioria das vezes, nas toxicomanias
tem-se um desenvolvimento sintomático, no qual existe uma cristalização da
posição do indivíduo numa relação de exclusividade com a droga. Dando ênfase às
demandas do sujeito é imaginável o alheamento do paradigma da dependência
química, para ponderar a relação do sujeito com o tóxico.
Não se considera
qualquer consumo de drogas como toxicomania. As toxicomanias se edificam
enquanto sintoma quando o sujeito entra em uma relação tóxica com a droga, isto
é, quando sua ingestão passa a ser saída para seus conflitos psíquicos
(TOROSSIAN, 2004).
Nesse sentido, o processo de cura aposta numa
mudança de posição subjetiva, no qual o analista precisa abster-se de sugerir qual
a melhor saída para o sujeito. Diferentemente de outras correntes, para a
psicanálise, a recomendação de cura não significa abstinência ou
não-abstinência, porém sim a escuta do desejo inconsciente (TOROSSIAN, 2004).
De acordo com
Conte (2001) existem dois modos distintos de conceber a toxicomania, que falam
da posição subjetiva do toxicômano: pela lógica da suplência, referindo-se às
toxicomanias mais graves e pela lógica do suplemento, associada às menos
graves.
O papel da
toxicomania de suplência é funcionar como prótese do interesse simbólico,
resistindo à invasão do Outro. Este tipo de toxicomania demanda um trabalho de
costura, que consinta a construção de um eu, de um objeto e de um endereçamento
ao Outro.
Segundo Conte
(2001), nessas toxicomanias o uso de drogas toma um espaço de manutenção de um
possível Sinthoma. O tóxico (sinthoma) entra como
suplência na falta do quarto elo do Real, Simbólico, Imaginário. Com isso,
qualquer intervenção realizada necessita cuidar para não diluir a função da toxicomania
antes que alguma coisa possa articular-se no lugar.
A orientação para
a abstinência poderia causar tal desestruturação, induzindo a uma crise ou a um
surto. Como nessas toxicomanias o “tóxico” beneficia uma entrega integral do
sujeito ao Outro, só é possível sugerir uma troca da droga via transferência
(CONTE, 2001).
Por isso a
psicoterapia é mais indicada para o tratamento que qualquer medicação, pois
atua nos valores pessoais, na filosofia de vida de cada um, resolvem os
conflitos e modificam a postura do indivíduo perante a droga. Tudo isso
favorece o entendimento do vício, de modo que o dependente tenha forças para
enfrenta e solucionar a questão. Mesmo quando o tratamento é biológico
(internação para desintoxicação), a ajuda das terapias psicológicas é
importantíssima para que a pessoa compreenda tudo o que está acontecendo com
ela.
3. Intervenção e tratamento
Considerando o
sujeito toxicômano, dependendo do tempo de uso da substância psicoativa, uma
intervenção mais severa é o adequado. Ineficazes são as práticas adotadas hoje
em Caps/ad, onde o sujeito não é assistido no período crítico de risco após às
18h00. Algumas unidades funcionam 24 horas, porém não são suficientes para uma
real eficácia no tratamento. A internação de curta temporada seria o caminho
mais adequado, nos moldes do novo modelo de cuidados mentais, entre 30 a 90
dias.
Torna-se
necessário para embasar a ineficácia do Caps/ad o trabalho de campo em
dependentes assistidos pela unidade em Cachoeiro de Itapemirim-ES. Oito em cada
dez usuários continuam abusando de drogas mesmo durante o tratamento nas
unidades. Em entrevista realizada no bairro Coramara, em Cachoeiro de
Itapemirim-ES, no dia 07 de agosto de 2013, quatro dependentes químicos, um do
sexo feminino e três masculinos, integrantes do programa, afirmaram que
participam das oficinas, terapias e alimentação durante o dia, porém, após
saírem do Caps, continuam usando álcool e drogas ilícitas.
Outro exemplo de
colaboração do poder público, mesmo que indiretamente, para o aumento dos
usuários de substâncias psicoativas estão no abandono de obras que seriam
utilizadas para o tratamento.
Em matéria
publicada no jornal Espírito Santo de Fato na edição de 01 de outubro assinada pela
jornalista Beatriz Caliman diz que o Centro de Tratamento ao Toxicômano (CTT)
em Marataízes tinha a proposta de transformar o balneário em referência no
atendimento à dependência de drogas no Espírito Santo. A obra começou em 2010,
mas, antes de ser concluída, foi paralisada.
“Orçada em mais de
R$ 1,2 milhão, a construção do CTT ofertaria, além de tratamento ao paciente
dependente químico, atividades terapêuticas, lúdicas, esportivas e até de
geração de renda. Porém, denunciam moradores, o abandono teve efeito contrário
e o local passou a ser ponto de usuários de drogas”.
O que deixa a
população ainda mais revoltada é a localização da obra. Erguida em terreno de
quase mil metros quadrados, a estrutura fica ao lado do Ministério Público e
atrás do Fórum.
A construção era
realizada pela Prefeitura de Marataízes, em parceria com o governo do Estado.
Mas, a falta de dinheiro teria provocado a sua paralisação. A reportagem entrou
em contato com a assessoria de comunicação da Prefeitura, mas não obteve
retorno até o fechamento da matéria.
No tratamento é
essencial uma ressignificação da história particular, e não somente a oferta
camuflada de um novo sistema de valores. Essa ressignificação induzirá a uma
nova posição do sujeito na palavra e à instauração de novos trajetos simbólicos
(CONTE, 2001).
Para concluir a respeito da paradoxal questão da
autodestruição versus tentativa de autoconservação na
toxicomania, Nunes (1999) diz que o toxicômano ao proferir “não posso viver sem
a droga”, constitui uma relação, pela cadeia discursiva, na qual há uma
impossibilidade da experiência de privação ou de abstinência da droga, pois, o
objeto ao produzir o indivíduo por identificação, na sua falta, elimina-o.
4. Comunidade Terapêutica não é manicômio
O temor de que
esteja ocorrendo um retorno aos antigos manicômios, proibidos pela Lei de Saúde
Mental (10.216), sancionada em 2001, por alguns especialistas é um retrocesso
às novas políticas públicas sobre drogas.
Para alguns
profissionais da área, o anúncio do financiamento governamental às Comunidades
Terapêuticas (CT’s) vai contra as diretrizes já consolidadas, porque as CT’s
funcionam com isolamento do indivíduo, ou seja, contrário às normas do Sistema
Único de Saúde (SUS), da Política de Atenção Integral ao Usuário de Drogas e
outros.
Essa conclusão é
baseada em visitas a centros de recuperação sem nenhuma estrutura e equipe
técnica qualificada que, de fato, usam o nome “comunidade terapêutica” como
fantasia, mas, na verdade, são clínicas sem qualquer condição de reabilitar
ninguém, muito menos manter seu funcionamento. Felizmente há pessoas e
entidades sérias trabalhando para que os resultados terapêuticos sejam
positivos e, por isso, merecem sim financiamento do governo.
Ao contrário do
que pensam esses “especialistas”, há comunidades terapêuticas que promovem o
convívio social por meio da reinserção. Claro que estou falando de CT's para
adultos. Um período curto de reclusão (no máximo três meses), mas com visitas
familiares, é necessário em alguns casos, pois cada indivíduo apresenta um
quadro único da dependência, embora conviva com outros.
No caso dos
adolescentes, e da internação compulsória, é mais complicado. Uma nova forma de
atuação deve ser debatida entre a sociedade e poder público. Não acredito em
repressão, mas a educação de verdade deve ser severa em casos mais graves,
quando o menor já começa a praticar delitos para manter o vício.
A comunidade
terapêutica, no molde que acho eficaz, não é prisão, muito menos manicômio. O
residente tem a liberdade de desistir do tratamento quando quiser, mas se
continuar e conseguir passar pela Síndrome de Abstinência, já entra
automaticamente no processo de reintegração em participação de grupos de
autoajuda com a presença da família.
Para repassar
dinheiro público às CT’s, o governo decidiu, em 2011, revogar a Resolução 101/2001
da Agência Nacional de Vigilância Sanitária (Anvisa), que estabelecia regras
mínimas a serem seguidas pelas unidades de tratamento. A decisão de cassar a
resolução visa atender à nova perspectiva de acolhimento das comunidades e
incluir no quadro de entidades financiadas com recursos do governo aquelas que
tinham “dificuldades” de infraestrutura e de equipe técnica. Decisão acertada.
Posteriormente, a
Anvisa publicou uma norma para que um profissional de nível superior seja
responsável técnico, sem que ele seja necessariamente da área de saúde, para
ajudar na organização das comunidades terapêuticas, grande parte delas mantida
por voluntários. Claro que quem presta este serviço logo busca capacitação, sem
o qual não teria condições de ser responsável por uma entidade que cuide de
dependentes químicos.
“O movimento da
Reforma Psiquiátrica, iniciado no final dos anos de 1970, resultou na aprovação
da Lei de Saúde Mental, que há dez anos prevê o tratamento aberto, com convívio
comunitário, sem o isolamento (Artigo ‘Modelo Adotado em Comunidades
Terapêuticas pode Significar volta aos Manicômios, segundo Especialistas’ -
newspsicologado.com - publicado em 29 de agosto de 2012)”. Por isso a presença
da comunidade (associação de moradores, igrejas, sindicatos e outros) onde está
inserida a CT é fundamental até para amparar legalmente a instituição, além de
manter o dependente no convívio social tanto enfatizado pelos críticos.
4. Interferência
Pessoas que
sucumbiram ao crack não conseguem largar o vício deixando doente, não só o
dependente, mas toda a família. Sozinhos, os dependentes, muitas vezes, não têm
forças para buscarem tratamento e, quando tentam, a grande maioria abandona por
causa da abstinência.
Casos de
familiares que, no desespero, tentam de várias formas “ajudar” seus entes
queridos são frequentes hoje. Para se livrarem do “problema” ou o abandonam ou,
literalmente, jogam o parente em qualquer lugar, como em clínicas para
tratamento de doenças mentais. Não saber lidar com o dependente é uma falta de
cultura e habilidade que deve ser superada com esforço e paciência.
Para isso, vale
ressaltar, a importância na participação dos familiares nos grupos de
autoajuda, como Alcoólicos Anônimos, Pastoral da Sobriedade, Amor Exigente,
Narcóticos Anônimos, dentre outros. Isso se realmente quiserem ajudar. Além
disso, prisão domiciliar e vigilância exacerbada com ameaças sem a devida
orientação de um profissional só agrava o problema.
Quanto às pessoas
que já foram abandonadas pelos amigos, pais, irmãos e outros. A situação é mais
problemática. No momento, nesse e em qualquer outro caso, sou contra a
internação compulsória e involuntária pelo simples fato de que nenhum desses
lugares que propõem essa medida extrema (São Paulo, Rio de Janeiro e agora Vila
Velha) estão preparados para receberem os andarilhos das cracolândias. A coisa
não é tão simples quanto parece.
É mais lógico e
razoável a construção e manutenção das clínicas e comunidades terapêuticas
espalhadas pelo país. Aí sim não seria hipócrita em não concordar com a
internação contra a vontade de um indivíduo que está doente. Enquanto isso não
acontece, medidas repressoras são arbitrariamente tomadas pelos familiares e,
agora, pelo poder público. 90% dos que são retirados à força das ruas voltam a
usarem a droga.
Em artigo
publicado na sua página pessoal, o reconhecido médico Drauzio Varela relata sua
experiência com trabalho em dependentes químicos e garante que o uso da droga
ilícita é modismo: vem e passa. Mesmo assim ele concorda com a internação
compulsória.
Para ele, a
cocaína não é tão aditiva como muitos pensam, “se o usuário não tiver acesso a
ela, nem aos locais em que a consumia, nem entrar em contato com companheiros
sob o efeito dela, nada acontece. Ao contrário, a simples visão da droga faz
disparar o coração, provoca cólicas intestinais, náuseas e desespero”.
Uma opinião
formada sobre o assunto seria, no mínimo, irresponsabilidade neste momento, mas
hoje, infelizmente, o Brasil não está preparado para tratar seus doentes. Quer
mostrar ruas limpas, sem mendigos, pedintes e viciados para o mundo, sem, ao
menos, ter a preocupação de tratá-los adequadamente.
4. Conclusão
Cabe salientar que
"nada é tão difícil para o homem quanto abdicar de um prazer que já
experimentou", Freud. E notamos que há esforços do poder público em
promover centros especializados para tratamento de dependentes químicos, mas
que ainda não são tão eficazes quanto o trabalho realizado por entidades
filantrópicas e sem apoio governamental. A pesquisa também se embasa na teoria
psicanalítica para entender o “mundo toxicômano”.
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obras psicológicas completas. Rio de Janeiro: Imago,1987. v. II.
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Durval Mazzei Nogueira Filho, & Manoel Tosta
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Bauman, ZygmuntO Mal-estar da pos-modernidade. Rio
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Dunselman
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Sinatra ES. ([s.d.]). Todo sobre lãs drogas? Buenos
Aires: Grama ediciones.
Horel S, & Lentin JP. Drogues & cerveau:
LSD, cocaïne, cannabis, opium, morphine, héroïne, alcool, tabac, ecstasy,
tranquillisants, antidépresseurs, jeu, boulimie, sexe. Paris: Actuel/Editions
du Panama, 2005.
*Psicanalista, jornalista e
professor. Bacharel em Teologia pela Faculdade Unida de Vitória, mestre em
Filosofia da Religião. Membro da Associação Psicanalítica do Estado do Espírito
Santo (APEES), da Associação Brasileira de Filosofia e Psicanálise (Abrafp) e
doutor em Psicologia e Teoria Psicanalítica (Dhc).