Como é difícil fazer o que nos
pede o Evangelho. Mateus 5, 43-48, então, nem se fala. Amar o inimigo, para
alguns, é o mesmo que enxugar gelo, colocar areia na farofa, ou até mesmo
renunciar algumas próprias convicções. Mas não é um mal necessário. Muito pelo
contrário.
Como a psicanálise, que
efetivamente afasta o sujeito da alienação, ela encontra “inimigos” visíveis e
invisíveis por todo o canto, justamente por ser livre seu exercício, muitos
buscam moldá-la, sem sucesso, e daí tentam a manipulação com exigências ou
mesmo vê-la longe, segundo o psicanalista Evandro Limongi Marques de Abreu.
“Se querem reserva de mercado,
verbas e financiamentos públicos, o lucro fácil pela desgraça alheia soterrada
de pílulas, síndromes, transtornos e o mais, inventados diariamente por tais facilitadores.
Nada conseguirão! Sempre que alguém falar e outro ouvir, ali ela estará”!
Hoje se tem pílula para tudo. Está
com depressão tome “isso” duas vezes ao dia. Tem angústia ou aflição, basta um
comprimido “daquilo” antes de dormir e pronto. Até para inimizade tem remédio
manipulado. Tá de “cara feia” para alguém? Então deve tomar um coquetel de
genéricos para acalmar os “nervos”. É mais fácil, além de ser mais barato nas
farmácias populares. Lógico que há casos
em que o uso de medicamentos é necessário, mas, na maioria das vezes, o limite
entre o que é remédio e o que é tóxico encontra-se numa linha tênue. Tudo isso
é perdoável. Se eles não sabem o que fazem.
Amar o inimigo
Quanto ao preceito bíblico, no
versículo 46, Jesus Cristo fala do resultado dessa ação ousada de amar o
inimigo por parte de quem está ferido, moral ou financeiramente. “Porque, se
ameis aqueles que vos amam, que recompensa tereis?”
Não é para sair por aí fazendo
caridade em troca de alguma coisa, mas simplesmente seguir o caminho mais
estreito e difícil para encontrar a paz. É por isso que Cristo nos pede para
seguirmos esse caminho da perfeição. Se o Pai perdoa, eu também posso perdoar.
Difícil? Não! Quase impossível é um camelo passar pelo buraco da agulha. Mas
até isso é possível. Até um rico, ou qualquer que seja, entrar no reino dos
céus!
Na reflexão sobre as leituras de
hoje (Dt 26, 16-19, Sl 118, 1-2. 4-5. 7-8 (R. 1b) e Mt 5,43-48) a CNBB indica o seguinte: “um dos valores mais
determinantes da nossa vida é a justiça, mas na maioria das vezes deixamos de
lado a justiça de Deus para viver a justiça dos homens, fundamentada na troca
de valores e não na gratuidade de quem de fato ama”.
A reflexão continua dizendo que quem
ama verdadeiramente reconhece que Deus é amor e tudo o que somos e temos vem
dele, como prova desse amor gratuito. Assim, as nossas atitudes não podem ser
determinadas pelas diferentes formas de comportamento das pessoas que nos
rodeiam, mas pelo amor gratuito de Deus que deve fazer com que sejamos capazes
de superar toda forma de vingança em nome da justiça e procurar dar a nossa
contribuição para que o mundo seja cada vez melhor.
Enfim, diante de tudo sigo o historiador e político francês,
do século XVII, Alexis de Tocqueville, que disse a célebre frase: “precisamos
aprender a conviver com nossos inimigos, já que não podemos transformar todos
eles em amigos". Mesmo nos esforçando para isso. Complemento.
* Roney Argeu Moraes é psicanalista, jornalista, bacharel em Teologia, Mestre em Filosofia da Religião e Doutorando em Psicologia Pastoral.