“Todo
amor é recíproco, mesmo quando não é correspondido”, Lacan.
por
Roney Moraes *
Se eu fosse o prefeito de
Cachoeiro, após a melhora de sua aprovação, administrativa e pessoal, com base
em pesquisa publicada no jornal A Gazeta, diria aos adversários com toda a
autoridade: “eu saio da fossa, xingando em nagô. Você que ouve e não fala. Você que olha e
não vê. Eu vou lhe dar uma pala. Você vai ter que aprender... A tonga da
mironga do cabuletê”.
O xingamento em
nagô, “tonga da mironga do cabuletê”, significa “o pêlo do c... da mãe”, daria
um mote para a teoria do desenvolvimento psicossexual do mandato. Como é de
quatro anos, deve passar, se considerado um indivíduo, mesmo que jurídico,
pelas fases, oral, anal e fálica. Em caso de reeleição, de latência e genital.
Na verdade, tudo
isso para descrever um sentimento de descarga emocional, em relação aos que
perduram na insistência de que as ações da prefeitura não vão dar certo, não
seria tão necessário. O momento é outro. A situação é outra e um governo nunca
é singular, salvo as ditaduras.
O certo, pelo que
parece, é que está dando. O primeiro passo é esse aí para quem quiser ver, mas,
por enquanto, só têm àqueles que olham e não vêem, como na letra do “Poetinha”.
A psicanálise como um dispositivo
político, pode aliviar e analisar essa tensão. Não estou retornando as fases
psicossexuais da infância, sejam elas anais, fálicas, ou quais quer que sejam.
O xingamento em nagô é só para sair da dureza do protocolo, sem perder a
ternura jamais. Quero dar um sentido político de libertação. Ao grito preso na
garganta. Catarse. Imaginem um gestor que recebe críticas durante dois anos e
hoje colhe alguns frutos de sua colheita. Mesmo não tendo lucro imediato, como
se o que ganha dá apenas para pagar as contas. É aliviador.
Com Toquinho,
Vinícius de Moraes compõe a canção “A Tonga da Mironga do Cabuletê” para
apresentá-la no Teatro Castro Alves. Era a oportunidade de xingar os militares
em 1970 sem que eles compreendessem a ofensa. E o poeta ainda se divertia com
tudo isso: “Te garanto que na Escola Superior de Guerra não tem um milico que
saiba falar nagô”.
Não é para o
prefeito ir cantar ou xingar os adversários na língua do “P”, de PT, no Teatro
Rubem Braga (se bem que seria impagável). Mas, os críticos de hoje interpretam
a pesquisa, ou qualquer movimento de Casteglione, até em hebraico para comer as
vogais e dar consonância apenas no que lhes interessa. Mas isso é outro caso.
Neste, que antes era trágico e
agora cômico, é, sem dúvida, uma condição lacaniana. Quando o prefeito se
depara com a fantasia que sustenta sua neurose (de que tem que ser um ótimo gestor,
ou de que deve ser o bem amado, ou ainda vai ser o melhor político que já
passou pela cidade) e vê que nada disso é realidade plausível ou mensurável dá
conta de que é humano e dentro de seus limites está fazendo algo acontecer. Se
sente aliviado. “Graças a Deus!”, é óbvio que deve ser a primeira frase que lhe
veio à cabeça.
O que acontece nesses casos é que,
supondo seja a pessoa por trás da cadeira do executivo, ou de qualquer outra
situação neurótica parecida é comum a pessoa dizer: “eu estava sofrendo há
tanto tempo só por causa disso”? Tem um tom irônico no fim das contas. Ela ri
das suas pretensões, do seu superego, da sua voluntária escravidão.
Conforme o jornal, de 2010 até
agora, a avaliação positiva da prefeitura cresceu 12,3 pontos. Há dois anos o
índice era de 16,4%, contra 23,8% do ano passado.
A reprovação da gestão caiu 15,1
pontos, de 37,3% em 2010 para 22,2% neste ano. Em 2011, a avaliação negativa
foi de 29,2%. Para 47%, a administração é considerada regular.
A condição atual de Carlos
Casteglione está longe de ser apenas pessoal. É coletiva. O PT de Cachoeiro
está em
festa. Com cautela,
é lógico. Os petistas são um ponto à parte. Diferenciados dos demais militantes
de outras siglas.
Completo com o que disse a
psicanalista Maria Rita Kelh sobre o MST. No mesmo sentido entendo os petistas:
“eles distinguem o que é o problema deles, que é sua situação de classe. (...)
Parece que o valor das pessoas não depende tanto de se fazerem amar ou desejar
pelo outro; está mais ligado à sua relação com o ideal que norteia a
militância. O que também é problemático, claro, mas é interessante encontrar
uma formação subjetiva um pouco diferente”.
Estar
na situação é bem diferente de ocupar a oposição. Papel muito bem desempenhado
pela esquerda brasileira até a ascensão dos trabalhadores e seus coligados ao
poder. Ser pedra é fácil. Difícil é ser vidraça.
*
Roney Argeu Moraes é psicanalista, jornalista, bacharel em Teologia, mestre em
Filosofia da Religião e doutorando em Psicologia Pastoral.
roneyamoraes@gmail.com
www.roneymoraeslivre.blogspot.com
@roneyamoraes