“O preço pago
para que o sujeito possa viver nos laços sociais é a neurose”.
por Roney
Moraes*
Há tempos venho tentando refletir sobre
a relação entre a psicanálise e a escola. Conversando com uma psicóloga, que
não gosta de Freud por ele, segundo ela, não primar pela coletividade, resolvi
então me entreter e atrever a explicar o motivo pelo qual Freud tem essa
relação “disfuncional” com o coletivo. Começo pela educação, porque depois da
família, a escola é o primeiro grupo social que temos o contato importante para
que aprendamos a interagir com pessoas, a conhecer novos comportamentos e a
respeitar uns aos outros. Pois bem é um
laboratório de inclusão social.
Freud fala sobre educação de forma relevante.
Isso porque seus estudos sobre a neurose o conduziram a um beco sem saída: a
contradição entre pulsões sexuais e civilização. Era disso que a psicóloga
falava quando criticava a análise freudiana. Mas eu, particularmente, acho a
mais coerente em se tratando de definição estruturação do impulso.
“Encontramos a educação operando esta
relação, voltada para a inscrição social do sujeito na cultura, na civilização
através do recalque das forças pulsionais enquanto anárquicas e destrutivas”,
segundo observações analíticas freudianas.
De acordo com o estudo sobre a educação
e subjetividade, a escola socializa em função de um recalque. Inicialmente para
Freud, o recalque é produtor da neurose. O recalque é produto da educação.
Desse modo não há como não olhar para a educação, na medida em que esta opera a
passagem da natureza pulsional para a cultura introduzindo a renúncia
pulsional. Diante disso há a neurose.
A renúncia ao gozo pulsional é produtora
da civilização, da cultura. O preço pago para que o sujeito possa viver nos
laços sociais é a neurose. Lógico. O
agente cultural é aquele que sofre. E como diria o poeta “chega a fingir que é
dor a dor que deveras sente”. Temos, então, de pronto um impasse, pois não é
possível para o homem viver fora dos laços sociais. Para isso ele tem que
encarar a neurose.
Conforme o texto, atualmente ainda
encontramos esta ideia simplificaria para tratar do sofrimento humano; o clichê
popularizado da psicanálise de que a eliminação do recalque oferece felicidade
ao ser humano. A leitura apressada destas ideias de Freud inspirou os trabalhos
de Reich e Marcuse, dirigindo-os para a busca de uma sociedade sem recalques.
As renovações educacionais também se
alimentam desta relação (pulsão x civilização). Em nome dela a escola busca
“não reprimir” e deixar a criança livre para se “desenvolver”. Ocorre que, se a
educação não recalca, não exerce sua função de socializar o humano. Se as
pulsões sexuais anárquicas não forem reprimidas a barbárie se instala e os laços
sociais se desfazem.
A partir daí começa uma nova reflexão
multidisciplinar para conter o descontrole e, ao contrário de apurações
apressadas, a psicanálise apresenta-se como um discurso que interage e tenciona
com os demais discursos presentes em nossa sociedade, em campos tão variados
quanto os da educação, além de outros.
Foi a própria psicanálise que originou a
questão, e, por isso, deve ser levada em consideração quando o assunto for
tratado por especialistas educacionais. Sem conhecer essa relação pulsional, esses
mesmos profissionais da área pedagógica estão fadados ao fracasso.
A escola é orientadora de consciências
ou retrato de uma sociedade doente e sem referenciais? Podemos nos conformar
com uma escola totalmente desprovida de autoridade?
Quanto mais fracas as instituições vão
se tornando (entre elas, a escola), mais a sociedade caminha por "escapismos"
sem rumos e direção. A utilização de entorpecentes é uma forma de “escapismo”,
que, infelizmente, é uma realidade na maioria das escolas, principalmente, das
áreas periféricas. Mas isso é assunto para outra hora.
*Psicanalista,
jornalista e teólogo