sexta-feira, 1 de fevereiro de 2013

O dependente, a família e a internação




"Para se livrarem do 'problema' ou o abandonam ou jogam em qualquer lugar"

por Roney Moraes*

Uma verdadeira epidemia tomou conta do país. Pessoas que sucumbiram ao crack não conseguem largar o vício deixando doente, não só o dependente, mas toda a família. Sozinhos, os dependentes, muitas vezes, não têm forças para buscarem tratamento e, quando tentam, a grande maioria abandona por causa da abstinência.

Casos de familiares que, no desespero, tentam de várias formas “ajudar” seus entes queridos são frequentes hoje. Para se livrarem do “problema” ou o abandonam ou, literalmente, jogam o parente em qualquer lugar, como em clínicas para tratamento de doenças mentais. Não saber lidar com o dependente é uma falta de cultura e habilidade que deve ser superada com esforço e paciência.

Para isso, vale ressaltar, a importância na participação dos familiares nos grupos de autoajuda, como Alcoólicos Anônimos, Pastoral da Sobriedade, Amor Exigente, Narcóticos Anônimos, dentre outros. Isso se realmente quiserem ajudar. Além disso, prisão domiciliar e vigilância exacerbada com ameaças sem a devida orientação de um profissional só agrava o problema.

Quanto às pessoas que já foram abandonadas pelos amigos, pais, irmãos e outros. A situação é mais problemática. No momento, nesse e em qualquer outro caso, sou contra a internação compulsória e involuntária pelo simples fato de que nenhum desses lugares que propõem essa medida extrema (São Paulo, Rio de Janeiro e agora Vila Velha) estão preparados para receberem os andarilhos das cracolândias. A coisa não é tão simples quanto parece.

É mais lógico e razoável a construção e manutenção das clínicas e comunidades terapêuticas espalhadas pelo país. Aí sim não seria hipócrita em não concordar com a internação contra a vontade de um indivíduo que está doente. Enquanto isso não acontece, medidas repressoras são arbitrariamente tomadas pelos familiares e, agora, pelo poder público. 90% dos que são retirados à força das ruas voltam a usarem a droga.

Em artigo publicado na sua página pessoal, o reconhecido médico Drauzio Varela relata sua experiência com trabalho em dependentes químicos e garante que o uso da droga ilícita é modismo: vem e passa. Mesmo assim ele concorda com a internação compulsória.

Para ele, a cocaína não é tão aditiva como muitos pensam, “se o usuário não tiver acesso a ela, nem aos locais em que a consumia, nem entrar em contato com companheiros sob o efeito dela, nada acontece. Ao contrário, a simples visão da droga faz disparar o coração, provoca cólicas intestinais, náuseas e desespero”.

Também manifestou o senador Ricardo Ferraço sendo favorável à internação involuntária para dependentes de crack. Só quero perguntar o seguinte: para onde vão? Quem vai "pegar" essas pessoas na rua? A polícia? Médicos? As instituições estão preparadas para recebê-las? Duvido!

Sei que em muitas ocasiões, para o bem ou para o mal, medidas impopulares devem ser tomadas, mas acho que as populares dão mais votos. Tirar o incômodo dos olhos da população é, eleitoralmente, mais vantajoso e simpático para quem vive da honra e audiência alheia e alienada.

Uma opinião formada sobre o assunto seria, no mínimo, irresponsabilidade neste momento, mas hoje, infelizmente, o Brasil não está preparado para tratar seus doentes. Quer mostrar ruas limpas, sem mendigos, pedintes e viciados para o mundo, sem, ao menos, ter a preocupação de tratá-los adequadamente. Viva a Copa do Mundo!

*Jornalista, psicanalista, professor e articulista membro da ACL.