domingo, 27 de outubro de 2013

Decifra-me e mesmo assim eu te devoro



“As grandes coisas podem ser reveladas através de pequenos indícios”, Freud

por Roney Moraes

A tragédia Édipo Rei (escrita por Sófocles por volta de 427 a.C.) dá nome ao complexo “chave” para método proposto por Sigmund Freud. Édipo traduz em ação um desejo que todos têm na infância (tomar a mãe e sentir ciúmes do pai).

O Complexo de Édipo é o período que compreende a descoberta psíquica após as fases oral, anal e genital. É um desejo que remete-se à infância. Tão importante e forte que decifrar as neuroses pode liquidar até monstros míticos inconscientes, como Édipo decifrou o enigma da Esfinge (que criatura pela manhã tem quatro pés, ao meio-dia tem dois, e à tarde tem três?) na entrada de Tebas.

Se pensarmos em devorar ou comer o outro, em várias civilizações e tribos vamos achar literaturas ou rituais canibalescos. Alguns povos devoravam outros por acreditarem que, com isso, ganhariam conhecimento e a força do adversário. O medo da castração pelo pai está ligado à fantasia de que, como Chronos, ele vai engolir ou aniquilar sua prole para que não seja destronado.

Estamos discorrendo sobre manifestações inconscientes. Portanto, como na tragédia de Sófocles, Édipo, ao descobrir que assassinou o pai verdadeiro e desposou Jocasta, sua mãe, e que esta cometeu suicídio, cegou-se. A cegueira simboliza o enfrentamento da realidade que acompanha a revelação de tudo que está reprimido.

Nos primórdios da psicanálise, Freud relata que o processo feminino é diferente. Ela, a menina, descobre, na fase genital, que já é castrada e, por isso, põe a culpa na mãe. Enquanto os meninos desenvolvem a angústia de castração, as meninas sentem a “inveja do pênis”. O caminho do desenvolvimento sexual feminino é muito mais complexo que isso.

A menina também vive este dilema, originando o denominado, por Carl Gustav Jung, Complexo de Electra. Ele é baseado no mito grego segundo o qual Electra, para vingar o pai, Agamêmnon, incita seu irmão Orestes a matar a mãe, Clitemnestra, e seu amante Egisto.

A superação dos complexos se dá quando o menino e a menina passam a se identificar novamente com os pais no período de latência (após as fases oral, anal, falida e complexo de Édipo e Electra há uma lacuna até a puberdade quando, de fato, os jovens iniciam a sua vida sexual). E para lhe dar condições para enfrentar as questões do futuro é imprescindível que a conversa aberta com as crianças (principalmente sobre sexualidade), sem julgamentos, faz com que haja uma relação de confiança e respeito, portanto, essas crianças podem se defender de pessoas mal intencionadas.

Não se esqueçam que, como nos contos de fada ou nos mitos, para prepararmos reis ou rainhas devemos começar a cuidar da educação e instrução das crianças, em casa, na comunidade ou escola, como se fossem príncipes ou princesas. As fases da infância passam, mas o reinado do “Eu” só acaba quando não tratamos as frustrações, portanto não podemos dar oportunidade para a Esfinge da ignorância nos devorar. Outras situações já nos são bem “carnívoras”. Mas, quanto à Esfinge, basta, com inteligência, decifrar os enigmas que surgem, repentinamente, todos os dias.

Para isso, temos que enfrentar de frente nossos monstros. Já que fazemos parte de um grande “Banquete” platônico, onde o amor (Eros) é o prato principal, sejamos sensatos em admitir a modéstia freudiana, que simplesmente pretende transformar a miséria da neurose em infelicidade comum. Sem querer ser complexo.

roneyamoraes@gmail.com