quarta-feira, 15 de outubro de 2014

A psicanálise e o discurso neoliberal



“Com o estabelecimento da sociedade burguesa, as relações de dominação e servidão foram recalcadas e parece que lidamos com seres livres, com relações isentas de fetichismo. Contudo, a verdade recalcada - a persistência das relações de dominação e servidão — emerge em um sintoma que subverte a aparência ideológica de igualdade e liberdade”, Zizek.

Entendemos que alguns fazem "política" - se é que se pode fazer isso- com o desejo de destruição do outro. As ações, além de movidas para adquirir os bens materiais do objeto odiado (o povo), transcendem para o impedimento de ações que possam ser promovidas a favor dos menos favorecidos no futuro. É uma agressão atemporal.

No passado fomos calados pela ditadura. No presente, vilipendiados pela ignorância e falta de argumento político. E agora? Para o futuro? Nem Deus, nem Marx, muito menos Freud podem prever a catástrofe apocalíptica que acontecerá com a classe operária.

O que se quer eliminar não é só aquele que está ali, o oprimido, mas o real, aquilo de insuportável e ingovernável que aparece como o impossível de ser abarcado, representado, dominado.

Os moradores de rua, os pobres, negros, indígenas ou favelados não obedeceriam a nenhuma regra de sociabilidade, ou seja, estariam além da governabilidade. Nessa medida, mostrando-se no real, os estes indivíduos "antissociais" aparecem como corpos fictícios, fora do tempo e do espaço. Não têm rosto, nome ou laço.

Numa adaptação ao estudo psicanalítico de Miriam Debieux RosaI, Taeco Toma CarignatoII e Sandra Letícia BertaI, sob o tema "Ética e política: a psicanálise diante da realidade, dos ideais e das violências contemporâneos", interpreto que o sujeito tenta eliminar o que foge ao real (a realidade que suspende os dilemas éticos e propõe uma política  que gera, além do mal-estar, violências físicas e psicológicas).

A psicanálise, em vez de adaptação à realidade, enfatiza o encontro com o real pulsional, traumático, pois constata que o objeto do desejo não existe na realidade. Não há um sentido estabelecido para a vida. Só vazio. Não há como responder ao che vuoi? (o que o outro quer?).


O sujeito capitalista ofuscado pela imagem de si estremece no encontro com o real (o indivíduo ingovernável. A flor amarela no meio do concreto), pois se depara com a sua condição trágica. No desejo está a verdade do sujeito. Mas o sujeito é um vazio sem autor, sem lenço, sem documento. Sem argumento.