“Com o estabelecimento da sociedade burguesa, as relações
de dominação e servidão foram recalcadas e parece que lidamos com seres livres,
com relações isentas de fetichismo. Contudo, a verdade recalcada - a
persistência das relações de dominação e servidão
emerge em um sintoma que subverte a aparência ideológica de igualdade e
liberdade”, Zizek.
Entendemos que alguns fazem "política" - se é
que se pode fazer isso- com o desejo de destruição do outro. As ações, além de movidas
para adquirir os bens materiais do objeto odiado (o povo), transcendem para o
impedimento de ações que possam ser promovidas a favor dos menos favorecidos no
futuro. É uma agressão atemporal.
No passado fomos calados pela ditadura. No presente,
vilipendiados pela ignorância e falta de argumento político. E agora? Para o
futuro? Nem Deus, nem Marx, muito menos Freud podem prever a catástrofe
apocalíptica que acontecerá com a classe operária.
O que se quer eliminar não é só aquele que está ali, o
oprimido, mas o real, aquilo de insuportável e ingovernável que aparece como o
impossível de ser abarcado, representado, dominado.
Os moradores de rua, os pobres, negros, indígenas ou
favelados não obedeceriam a nenhuma regra de sociabilidade, ou seja, estariam
além da governabilidade. Nessa medida, mostrando-se no real, os estes
indivíduos "antissociais" aparecem como corpos fictícios, fora do
tempo e do espaço. Não têm rosto, nome ou laço.
Numa adaptação ao estudo psicanalítico de Miriam Debieux
RosaI, Taeco Toma CarignatoII e Sandra Letícia BertaI, sob o tema "Ética e
política: a psicanálise diante da realidade, dos ideais e das violências
contemporâneos", interpreto que o sujeito tenta eliminar o que foge ao
real (a realidade que suspende os dilemas éticos e propõe uma política que gera, além do mal-estar, violências
físicas e psicológicas).
A psicanálise, em vez de adaptação à realidade, enfatiza
o encontro com o real pulsional, traumático, pois constata que o objeto do
desejo não existe na realidade. Não há um sentido estabelecido para a vida. Só
vazio. Não há como responder ao che vuoi? (o que o outro quer?).
O sujeito capitalista ofuscado pela imagem de si
estremece no encontro com o real (o indivíduo ingovernável. A flor amarela no
meio do concreto), pois se depara com a sua condição trágica. No desejo está a
verdade do sujeito. Mas o sujeito é um vazio sem autor, sem lenço, sem
documento. Sem argumento.