“A verdade só pode ser dita nas malhas da ficção”, Lacan.
Motivado pelo forte movimento cultural em Cachoeiro de
Itapemirim-ES, diga-se de passagem, para todos os gostos e linguagens, que
estou na tentativa (sempre) de compreender o que há no fazer artístico que o
faz tão importante e diferente de outros grandes temas da humanidade. Teria a
Filosofia ou a Psicanálise algo a dizer sobre a ficção?
Ao me deparar com o tema: “O homem que representa:
dramaturgia e cotidiano, ficção e realidade”, conduzida por Fábio Brito, Sara
Passabon Amorim e Fernando Marques, dentro da programação do 1º Cachoeiro Cult,
as cortinas para meus questionamentos se abriram e as respostas entrando em
cena, a cada ato.
Sei que boa parte das teorias psicanalíticas baseou-se em
obras de arte. Freud - criador da Psicanálise - não escondia sua admiração por
Shakespeare e por Goethe. Seu estudo sobre a obra e a vida de Leonardo da Vinci
foi fundamental para expor suas teorias sobre a sexualidade e em Wilhelm Jensen
encontrou um bom apoio para sua teoria sobre a psicose. Isso para não dizer que
a pedra angular de sua construção foi “Édipo rei”, de Sófocles.
Como classificar sua obra, “Totem e tabu”, onde,
magistralmente inventa um mito sobre a criação da cultura, tão bem difundido
que parece verdade histórica até hoje? Ficção pura, dirão os que são mais
chegados ao cientificismo. Por outro lado, há na ficção uma configuração de
realidade, ao menos é o que me parece.
Fernando Marques ilustrou toda sua fala num desempenho
catártico da sua vivência na ficção. Sara Passabon, brilhantemente, trouxe a
luz ao palco do debate: “a inteligência que move o artista”. E Fábio Brito mediou
as interlocuções com maestria.
Sem a resposta que meu ego queria ouvir saí repensando a
questão, já que por meio do conceito de expressão, Adorno considera tanto a realidade,
da qual a arte deduz como também os elementos subjetivos (os artistas) são
fundamentais para a realidade. Assim, arrisco dizer que a “fuga” para a ficção,
de modo inteligente, é capaz de realizar – através da estrutura de sua obra – uma
crítica contundente à cultura, ou seja, à realidade.
Não há uma regra que defina a busca pela ficção uma
simples fuga do real, pois a ficção e a realidade, em alguns casos, se
entrelaçam como uma boa atriz, que não gosta do universo adolescente,
interpreta “Ofélia”, personagem da obra “Hamlet”, de Shakespeare.
Em conversa informal com a psicanalista Hélida Mascarenhas, integrante do grupo “Freud Além da Alma”, idealizado pela também analista, Renata Ponte, eis que a psicoterapeuta lembrou-se da atriz francesa Sarah Bernhardt interpretando Joana D’arc.
Em conversa informal com a psicanalista Hélida Mascarenhas, integrante do grupo “Freud Além da Alma”, idealizado pela também analista, Renata Ponte, eis que a psicoterapeuta lembrou-se da atriz francesa Sarah Bernhardt interpretando Joana D’arc.
A atriz, com mais de 60 anos, numa cena da Inquisição, quando
perguntada sobre sua idade pelo inquisidor respondeu tranquilamente: “dezenove”.
Dizem os biógrafos que o teatro parou de
respirar, em suspenso, esperando a resposta... E que ela foi aplaudidíssima
após a fala. E alguém pode dizer que sua interpretação foge ao real? Creio que
não!