segunda-feira, 28 de maio de 2012

Psicanálise e toxicomania




“A nossa cultura acredita que é possível viver sem nenhuma dor”, Maria Rita Kehl.

por Roney Moraes*

Perguntado sobre o que a psicanálise pode fazer para combater esse “mal” contemporâneo, o profissional logo transforma em patologia a obsessão e compulsão. Sintomas que levam o indivíduo a usar substâncias psicoativas ou ter outros males como consumo exagerado, anorexia, bulimia, obesidade mórbida e, fatalmente, a toxicomania.
Esse é um sintoma do homem moderno, que por estar imerso no discurso capitalista, buscaria sua forma particular de obter a satisfação. O individualismo, estresse e outras complicações do cotidiano fazem com que o indivíduo busque adequação no modismo ou um escapismo que o leva a fugir da realidade em que vive e as drogas são ótimas nesse sentido.
Assim, dentro desse discurso é oferecida uma “prótese imaginária”, mantendo-os identificados a um significante – “eu sou alcoólatra, dependente de...”, frequentemente observados em suas falas. Os sujeitos ficam identificados no lugar de objeto e não ao lugar de objeto-causa, permanecendo atados ao seu “parceiro-sintoma”.
A particularidade de cada sujeito é descartada e os afetados tornam-se apenas portadores de uma “doença incurável”, onde os tipos de drogas utilizadas são hipervalorizadas, classificando-os pelo uso, abuso ou dependência. Nesse campo, de tratamento convencional, a cura passa primeiramente pela exigência da abstinência e, em seguida, pela introdução de medicamentos e orientações dentro do enfoque comportamental e cognitivo.
Os toxicômanos, por sua vez, não se apresentam à clínica, divididos e desejosos de saber sobre o seu “mal”, sedentos por uma interpretação. Desejam apenas amenizar a angústia e, talvez, aprender a fazer algo com seu corpo devastado por essa forma de prazer além de manejar a castração.
Assim, no campo da toxicomania, caracterizada pela atuação dos sujeitos, exigiria, também, um ato por parte dos psicanalistas que, ao assumirem a posição de analista, ofereceriam um lugar para o particular (o Ser) de cada sujeito.
O que é comum para todos os toxicômanos é que no lugar do objeto de desejo (que é simbólico e faz parte de uma eterna busca...) eles o substituem pelo objeto de necessidade. Estes são imperativos. O objeto de necessidade é aquele no qual o dependente é escravo.
A impulsividade de ter alguma coisa produz um vazio e este a adesão aos baratos. Tudo fica chato. Então a pergunta é: “o que é que me falta que eu preciso estar grudado o tempo todo nesse objeto que me complete?”
O toxicômano, com a ajuda da psicanálise, teria que chegar a entender que o que lhe falta não é a droga, mas algo que carece a todo o ser humano. Desde o nascimento somos faltantes de alguma coisa. E essa necessidade de busca, mesmo inconsciente, é que nos faz pensarmos, conversarmos, criarmos e aprendermos a lidar com a dor de viver.
Por isso a psicoterapia é mais indicada para o tratamento que qualquer medicação, pois atua nos valores pessoais, na filosofia de vida de cada um, resolvem os conflitos e modificam a postura do indivíduo perante a droga. Tudo isso favorece o entendimento do vício, de modo que o dependente tenha forças para enfrenta e solucionar a questão. Mesmo quando o tratamento é biológico (internação para desintoxicação), a ajuda das terapias psicológicas é importantíssima para que a pessoa compreenda tudo o que está acontecendo com ela. 


*Psicanalista, jornalista e teólogo.