“A nossa cultura acredita que é
possível viver sem nenhuma dor”, Maria Rita Kehl.
por Roney Moraes*
Perguntado sobre
o que a psicanálise pode fazer para combater esse “mal” contemporâneo, o
profissional logo transforma em patologia a obsessão e compulsão. Sintomas que
levam o indivíduo a usar substâncias psicoativas ou ter outros males como
consumo exagerado, anorexia, bulimia, obesidade mórbida e, fatalmente, a
toxicomania.
Esse é um
sintoma do homem moderno, que por estar imerso no discurso capitalista,
buscaria sua forma particular de obter a satisfação. O individualismo, estresse
e outras complicações do cotidiano fazem com que o indivíduo busque adequação
no modismo ou um escapismo que o leva a fugir da realidade em que vive e as
drogas são ótimas nesse sentido.
Assim,
dentro desse discurso é oferecida uma “prótese imaginária”, mantendo-os
identificados a um significante – “eu sou alcoólatra, dependente de...”,
frequentemente observados em suas falas. Os sujeitos ficam identificados no
lugar de objeto e não ao lugar de objeto-causa, permanecendo atados ao seu “parceiro-sintoma”.
A
particularidade de cada sujeito é descartada e os afetados tornam-se apenas
portadores de uma “doença incurável”, onde os tipos de drogas utilizadas são
hipervalorizadas, classificando-os pelo uso, abuso ou dependência. Nesse campo,
de tratamento convencional, a cura passa primeiramente pela exigência da
abstinência e, em seguida, pela introdução de medicamentos e orientações dentro
do enfoque comportamental e cognitivo.
Os
toxicômanos, por sua vez, não se apresentam à clínica, divididos e desejosos de
saber sobre o seu “mal”, sedentos por uma interpretação. Desejam apenas amenizar
a angústia e, talvez, aprender a fazer algo com seu corpo devastado por essa
forma de prazer além de manejar a castração.
Assim, no
campo da toxicomania, caracterizada pela atuação dos sujeitos, exigiria,
também, um ato por parte dos psicanalistas que, ao assumirem a posição de
analista, ofereceriam um lugar para o particular (o Ser) de cada sujeito.
O que é
comum para todos os toxicômanos é que no lugar do objeto de desejo (que é
simbólico e faz parte de uma eterna busca...) eles o substituem pelo objeto de
necessidade. Estes são imperativos. O objeto de necessidade é aquele no qual o
dependente é escravo.
A impulsividade
de ter alguma coisa produz um vazio e este a adesão aos baratos. Tudo fica
chato. Então a pergunta é: “o que é que me falta que eu preciso estar grudado o
tempo todo nesse objeto que me complete?”
O toxicômano,
com a ajuda da psicanálise, teria que chegar a entender que o que lhe falta não
é a droga, mas algo que carece a todo o ser humano. Desde o nascimento somos
faltantes de alguma coisa. E essa necessidade de busca, mesmo inconsciente, é
que nos faz pensarmos, conversarmos, criarmos e aprendermos a lidar com a dor de
viver.
Por isso a
psicoterapia é mais indicada para o tratamento que qualquer medicação, pois
atua nos valores pessoais, na filosofia de vida de cada um, resolvem os
conflitos e modificam a postura do indivíduo perante a droga. Tudo isso
favorece o entendimento do vício, de modo que o dependente tenha forças para
enfrenta e solucionar a questão. Mesmo quando o tratamento é biológico
(internação para desintoxicação), a ajuda das terapias psicológicas é
importantíssima para que a pessoa compreenda tudo o que está acontecendo com
ela.
*Psicanalista, jornalista e teólogo.