“É uma ilusão achar que só a internação
vai resolver o problema. Na verdade, a desintoxicação é só uma parte do
tratamento, pois o mais importante é a reinserção social”, Fátima Sudbrack.
por Roney Moraes*
O
temor de que esteja ocorrendo um retorno aos antigos manicômios, proibidos pela
Lei de Saúde Mental (10.216), sancionada em 2001, por alguns especialistas é,
no meu ponto de vista, um retrocesso às novas políticas públicas sobre drogas.
Para
alguns profissionais da área, o anúncio, no ano passado, do financiamento
governamental às Comunidades Terapêuticas (CT’s) vai contra as diretrizes já
consolidadas, porque as CT’s funcionam com isolamento do indivíduo, ou seja,
contrário às normas do Sistema Único de Saúde (SUS), da Política de Atenção
Integral ao Usuário de Drogas e outros.
Essa
conclusão é baseada em visitas a centros de recuperação sem nenhuma estrutura e
equipe técnica qualificada que, de fato, usam o nome “comunidade terapêutica”
como fantasia, mas, na verdade, são clínicas sem qualquer condição de
reabilitar ninguém, muito menos manter seu funcionamento. Felizmente há pessoas
e entidades sérias trabalhando para que os resultados terapêuticos sejam
positivos e, por isso, merecem sim financiamento do governo.
Ao
contrário do que pensam esses “especialistas”, há comunidades terapêuticas que promovem o convívio social por meio da reinserção. Claro que estou falando de
CT's para adultos. Um período curto de reclusão (no máximo três meses), mas com
visitas familiares, é necessário em alguns casos, pois cada indivíduo apresenta
um quadro único da dependência, embora conviva com outros.
No
caso dos adolescentes, e da internação compulsória, é mais complicado. Uma nova
forma de atuação deve ser debatida entre a sociedade e poder público. Não
acredito em repressão, mas a educação de verdade deve ser severa em casos mais
graves, quando o menor já começa a praticar delitos para manter o vício.
A comunidade terapêutica, no molde que acho eficaz, não é prisão,
muito menos manicômio. O residente tem a liberdade de desistir do tratamento
quando quiser, mas se continuar e conseguir passar pela Síndrome de
Abstinência, já entra automaticamente no processo de reintegração em
participação de grupos de autoajuda com a presença
da família.
Para
repassar dinheiro público às CT’s, o governo decidiu, em 2011, revogar a
Resolução 101/2001 da Agência Nacional de Vigilância Sanitária (Anvisa), que
estabelecia regras mínimas a serem seguidas pelas unidades de tratamento. A
decisão de cassar a resolução visa atender à nova perspectiva de acolhimento
das comunidades e incluir no quadro de entidades financiadas com recursos do
governo aquelas que tinham “dificuldades” de infraestrutura e de equipe
técnica. Decisão acertada.
Posteriormente,
a Anvisa publicou uma norma para que um profissional de nível superior seja
responsável técnico, sem que ele seja necessariamente da área de saúde, para
ajudar na organização das comunidades terapêuticas, grande parte delas mantida
por voluntários. Claro que quem presta este serviço logo busca capacitação, sem
o qual não teria condições de ser responsável por uma entidade que cuide de
dependentes químicos.
“O movimento da Reforma Psiquiátrica,
iniciado no final dos anos de 1970, resultou na aprovação da Lei de Saúde
Mental, que há dez anos prevê o tratamento aberto, com convívio comunitário,
sem o isolamento (Artigo ‘Modelo Adotado em Comunidades Terapêuticas pode Significar
volta aos Manicômios, segundo Especialistas’ - newspsicologado.com - publicado
em 29 de agosto de 2012)”. Por isso
a presença da comunidade (associação de moradores, igrejas, sindicatos e
outros) onde está inserida a CT é fundamental até para amparar legalmente a
instituição, além de manter o dependente no convívio social tanto enfatizado
pelos críticos.
* Psicanalista, jornalista, membro da Academia Cachoeirense de Letras (ACL).