sábado, 30 de novembro de 2013

Todos contra a hipocrisia







“Tema espinhoso na medida em que convoca a pensar sobre aquilo com que a sociedade não é muito afeita a se haver: as questões que lhe são próprias, a fissura da qual padece”, Márcia Tiburi.

Quem disser que não usa drogas hoje ou é ingênuo ou mentiroso. Praticamente, o uso de substâncias que alteram o estado mental vem acompanhando o ser humano há milhares de anos, quer seja por razões culturais, sociais ou religiosas. Claro que essa relação pode ser inofensiva, dependendo do caso, porém temos que ficar atentos quanto a isso quando os padrões de utilização de bebidas, medicamentos e outros começam a ser alterados.

Será mesmo que devemos considerar o uso de drogas um tabu, se o que temos é uma sociedade tão fissurada que “obriga” o sujeito a se viciar?  Este questionamento não é mencionado nas falas prontas cheias de desconfiança, ódio ou medo das rodas restritas nos seminários acadêmicos ou debates em torno do assunto frequentemente realizados.  

Vivemos em uma política de consumo exagerada com a expansão da indústria de psicofármacos. Talvez ligada ao neoliberalismo e a pós-modernidade. Os resultados deste cenário não são suficientes no sentido de curar o sofrimento humano, uma vez que a essência da droga psiquiátrica não é curativa e sim supressiva. Os medicamentos serenam, mas não curam. São “camisas de forças químicas”. Segundo estudiosos, prendem a constituição subjetiva do indivíduo ou prendem o indivíduo dentro de sua psicopatologia.

As drogas são um centro de poder importantíssimo. As lícitas estão em toda parte gerando lucro, emprego e renda, enquanto que as ilícitas servem para aumentar o gozo, o prazer e também movimentar grande quantidade de capital com fins de controle político legal. Vale ressaltar duas coisas: as lícitas também têm a mesma utilidade das drogas ilícitas e estas, ligadas ao submundo do crime organizado, financiam campanhas milionárias.

Para sermos eficazes no que propomos (uma reflexão séria que envolve análise crítica e desmistificação do fenômeno da toxicomania, sem julgamento moral) devemos primeiro olhar para trás e saber até que ponto evoluímos quanto aos estudos, procedimentos para, aí sim, nos contextualizarmos com a questão.

É fácil imprimir jargões “todos contra as drogas” no meio de uma sociedade repleta de hipocrisia. O mesmo sujeito que condena o compulsivo pelo crack ou cocaína compra diariamente seus cigarros na padaria, ou aquele (a) que julga o “beberrão” como vagabundo e irresponsável é o mesmo (a) que toma altos miligramas de diazepínicos para dormir. Notem que todas as substâncias (crack, cocaína e tabaco / álcool e diazepínico) têm o mesmo princípio ativo. No fundo, passeando pelo jargão popular, é a mesma coisa.

Lógico que há exceções. Algumas pessoas ficam vicias em medicamentos porque outras são dependentes de drogas ilícitas. Acontece na maioria das famílias que tem este tipo de problema, são codependentes. Mas a dor ou o sofrimento não desaparece num engradado de cerveja ou depois de uma pílula para dormir, ao contrário, aumenta junto com os problemas.

“Verdades” científicas e jurídicas, do ponto de vista moral, à parte, voltamos a nos questionar o motivo pelo qual toda a nossa sociedade vive hoje uma “epidemia” consumista de drogas. É certo dizer que os discursos inflamados com motivações emocionais têm alguma validade ou função salvadora milagrosa? Creio que não!