"O saber leigo, portanto, não é um “não-saber”, mas um conhecimento regulado pelo inconsciente"
Hoje é comum confundirmos as distintas profissões de psiquiatra e psicólogo com a ocupação de psicanalista. Para muitos não há diferença, mas cada um é singular naquilo que é, ou seja, possui suas atribuições e particularidades que não devem ser confundidas.
Para começar, o psiquiatra é alguém que fez Medicina. O psicólogo frequentou a graduação em Psicologia. E a Psicanálise? O próprio pai da disciplina responde em seu texto “A questão da análise leiga” publicado em 1926.
O objetivo de Freud foi dizer que o saber analítico não se aprende na universidade. É mais um texto revolucionário para sua época e os dias atuais, em que algumas correntes psicológicas tentam se apropriar do inapropriável.
Na realidade, o texto é fundamental para a defesa do psicanalista Theodor Reik que foi acusado, na época, de curandeirismo ante um tribunal de Viena. Contudo, a posição de Sigmund Freud é clara a este respeito. Ele defende o exercício da prática psicanalítica apenas por aqueles que tiverem realizado o percurso de análise.
Algumas organizações insistem em projetos de regulamentação da psicanálise, para transformá-la em profissão. Este "movimento", aparentemente, vem de pessoas ou grupos que desconhecem a formação, o estilo de transmissão e prática psicanalítica. Nenhum deles foi aprovado pelo Congresso e muito menos pela comunidade psicanalítica, que tem se posicionado, publicamente, contra qualquer tipo de regulamentação ou mesmo regulação da psicanálise.
A qualificação para o ofício de psicanalista se ajustaria aos modelos e certificados propostos pela Universidade ou por órgãos reguladores do Estado?
Cada grupo psicanalítico reinventa a psicanálise, conquistando a herança freudiana.A grande questão é sustentar a ética em nossa prática, inclusive a institucional. Porque a formação é permanente.
O saber leigo, portanto, não é um “não-saber”, mas um conhecimento regulado pelo inconsciente, embora não seja regulamentado por uma regra social. São as leis do inconsciente que encontram fundamento na própria linguagem.
O inconsciente dá a garantia de verdade para a psicanálise. Daí seu paradoxo pois a verdade está articulada em um lugar no qual o sujeito não sabe o que pensa e muitas vezes também não deseja o que quer.
Isso não implica numa irresponsabilidade na condução da transmissão. Hoje, na maioria dos institutos formadores, é consenso que para ser um analista o sujeito deve, além de ter formação superior nas áreas de saúde ou humanas, preferencialmente, deve submeter-se ao conhecimento teórico, análise pessoal e didática. Os estudos independentes ou em grupo duram a vida toda.
Diferente das demais correntes psicoterapêuticas, pode ser analista quem, a princípio, é analisado.